Vencemos muita vez o medo, com medo de não suportar por mais tempo a nossa falta de resistência. Passeamo-lo algumas vezes pelas curvas da nossa vontade, como quem caminha à beira mar nas iluminadas tardes de inverno, sujeitos à traição iminente de uma onda, que nos reduza em poucos segundos a mais um insignificante elemento, a emergir como blasfémia do vórtice. A vontade de o vencer é uma cirrose crónica, uma teimosia de pardal convicto que é andorinha. Eis… porque surgem as recaídas. O medo do medo reaparece. À esquina, depois da curva, fica-nos ainda… o desejo de o combater. Vontade que se agiganta, como se um oceano imenso nos coubesse por inteiro na nossa determinação. Por quanto tempo? Não interessa… porque o fundamental é que se atreva a inventar essa espécie de coador mental onde vamos deixando as pequenas partículas do que somos realmente. Somos o que pensamos ou pensamos o que somos? O que será mais ignóbil? A tentativa de disfarçar as nossas debilidades psíquicas, ou a vontade férrea de refazer as mais gritantes contradições? Será que o facto de vestimos o pânico, como quem enfia uma máscara, é uma fraqueza ou uma inteligente defesa? De quantas máscaras precisamos para encaixar o realismo da vida na têmpera que lateja, sempre que o pensamento nos torna reféns? Ter medo… do medo é sempre pior do que todos os Medos! Com alguma sorte, saberemos ensaiar um sorriso jocoso. Subiremos à montanha do nosso desespero, descalçando as pedras. E já no cume dessa montanha imaginária, talvez se acerque de nós a sensação estranha de assistirmos à desgarrada folclórica de pássaros esfomeados. - Haverá algo mais retemperador do que ouvir o chilrear de pássaros tendo como pano de fundo o zumbido esguio do vento? Não… não há! Até o medo cede a tão sublime beleza!
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